Pular para o conteúdo principal

O Último Fio de Azeite

O Último Fio de Azeite

A dívida...
Era uma sombra.
Dessas que crescem devagar...
Mas que um dia tomam tudo.

Meu marido servia aos profetas.
Um homem bom. Fiel. Temente a Deus.
Mas a morte…
A morte não pede licença.
Ela veio fria. Rápida. Cruel.
E me deixou com duas crianças…
E uma casa que só sabia ecoar silêncio.

O pão murchava na mesa.
Nem o mofo se interessava mais por ele.
E eu…
Eu já não sabia se chorava… ou se secava junto com a esperança.

Então, eles chegaram.
Não com lanças.
Mas com palavras afiadas.
Com mãos estendidas.
Com olhos que pesavam.
Queriam o que ainda me restava:
— “Seus filhos. Eles servirão como pagamento.”

A garganta se fechou.
Como porta trancada por dentro.
Quis gritar…
Mas o grito morreu.
E o medo se pendurou em mim como manto molhado — pesado, frio, impossível de arrancar.

Foi aí…
Foi aí que alguma coisa dentro de mim se levantou.
Talvez o instinto.
Talvez o desespero.
Talvez a última centelha de fé antes do fim.

Fui até Eliseu.
Minhas mãos tremiam. Meus pés tropeçavam.
Mas ele…
Ele me olhou como quem vê por dentro.
E perguntou, com voz que cortou o ar:

— O que você tem em casa?

Ri.
Ou melhor…
Solucei uma risada amarga.
Daquelas que saem secas.
Feridas.

— Nada.
… Apenas um pouco de azeite.

O pouco que ainda era meu.
Porque o resto…
O resto já tinha sido levado pela dor, pela dívida, pela ausência.

Ele disse:
— Vai.
— Pede vasilhas.
— Muitas.
— Mas não poucas.

Um pedido estranho.
Loucura, talvez.
Mas a fé…
Ah… a fé às vezes veste a roupa do absurdo.

Fechei a porta.
Como ele mandou.
Respirei fundo.
E com as mãos trêmulas… comecei a despejar.

E o fio…
Aquele fio de azeite que era só um restinho…
… não parava.

Escorria.
E escorria.
E escorria.

Meus filhos passavam os potes, os vasos, até os cacos.
E os olhos deles brilhavam…
Não de alegria.
Mas de susto.
Era o impossível diante deles.
Era o céu furando o teto da nossa dor.

E então…
Quando a última vasilha se encheu…
O azeite parou.

Não antes.
Não depois.
No exato momento em que a fé disse:
— Chega.

Voltei a Eliseu com o coração batendo como tambor.
Contei o que vi.
O que vivi.

E ele… com a mesma calma de antes… disse:

— Vende o azeite.
— Paga tuas dívidas.
— E vive… com o que sobrar.

Com o que sobrar?
Depois de tudo?
Depois do luto, do medo, da vergonha, da ameaça?

Mas talvez…
Talvez ainda houvesse vida entre os cacos.
Talvez houvesse futuro na sobra.

Hoje ainda acordo assustada.
Às vezes, ainda ouço aquelas vozes nos meus sonhos.
Mas quando entro na sala…
E vejo os vasos…
Alguns com flores.
Outros com trigo.
Lembro.

Lembro que a fé, mesmo escondida sob o pó do desespero, pode ser a semente de um novo começo.

Não.
Não sou uma mulher conhecida.
Meu nome… o tempo levou.
Mas meus filhos andam comigo.
E às vezes — só às vezes — quando o azeite brilha sob a luz da lamparina…
… parece que o próprio Deus passou por ali.

E ainda está.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Dinâmica: "Versículo Embaralhado"

 🎯 Dinâmica: "Versículo Embaralhado"  Desafie sua Memória! 📖🧩 🎯 Objetivo: Ajudar os adolescentes a memorizar versículos bíblicos de forma interativa e divertida, incentivando o trabalho em equipe. 📌 Como Funciona: 1️⃣ Preparação: Escolha um ou mais versículos bíblicos e escreva cada palavra separadamente em pedaços de papel. Se quiser dificultar, use versículos mais longos ou palavras misturadas de diferentes versículos. 2️⃣ Execução: Divida os adolescentes em equipes. Cada equipe recebe um conjunto de palavras embaralhadas. O objetivo é organizar as palavras na ordem correta para formar o versículo. Ganha a equipe que montar o versículo corretamente primeiro. 💡 Aplicação Espiritual: Depois da montagem, peça que cada grupo leia o versículo em voz alta e reflita sobre seu significado. Pergunte: "Como podemos aplicar essa palavra no nosso dia a dia?" Incentive os adolescentes a decorar o versículo e compartilhá-lo durante a semana. 📝 Dica Extra: Para um desafi...

64 d.C. – Perseguição do Imperador Nero contra os cristãos em Roma

A Perseguição de Nero contra os Cristãos (64 d.C.)  A Morte de Pedro e Paulo 1. Igreja Primitiva e Perseguições (33–313 d.C.)      O ano de 64 d.C. marcou um dos episódios mais sombrios da história do cristianismo primitivo: a perseguição aos cristãos promovida pelo imperador Nero. Esse evento não apenas fortaleceu a identidade dos seguidores de Cristo como mártires da fé, mas também teve um impacto profundo na relação entre o cristianismo e o Império Romano. Entre os que teriam sido mortos nessa perseguição estão os apóstolos Pedro e Paulo, dois dos mais importantes líderes da Igreja primitiva. O Grande Incêndio de Roma e a Culpa sobre os Cristãos      Na noite de 18 para 19 de julho de 64 d.C., um incêndio devastador tomou conta de Roma. O fogo durou seis dias e sete noites, destruindo grande parte da cidade. Fontes históricas, como o historiador Tácito, sugerem que muitos acreditavam que o próprio imperador Nero teria ordenado o incêndio para abrir ...

🌿Poema: Mulher Virtuosa, Águia do Senhor

 🌿 Mulher Virtuosa, Águia do Senhor Mulher, és águia altaneira, asas firmes contra o vento, nos vales da dor, és guerreira, no céu da fé, és livramento. Teu olhar enxerga além, tua alma voa sem temor, pois quem te guia e te sustém é o braço forte do Senhor. És força que rompe as montanhas, és abrigo em meio à aflição, nos altos céus Deus te acompanha, teu voo é feito em oração. Que a graça do Alto te ergue, que o amor divino te refaça, pois és mulher, és força, és promessa, és águia que ao céu sempre abraça. Del lobato